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sexta-feira, 24 de julho de 2020

Lido: Um amor em tempos de guerra, de Júlio Magalhães

Normalmente, escolho os livros consoante o que me apetece ler, e depois vou inserindo nas categorias dos projetos e/ou maratonas em que esteja a participar. Este foi procurado especificamente para completar as "casas". E foi bem seleccionado, diga-se de passagem.
Estamos no Vimieiro e seguimos um jovem, de seu nome António, em homenagem ao mais conhecido António daquela freguesia de Santa Comba Dão: o Doutor António de Oliveira Salazar, que agora está à frente do Governo, lá, em Lisboa. António tem uma vida perfeitamente comum, para qualquer criança da sua idade, até à morte do seu pai. Nessa altura, António sente que tem de ser o homem da casa, e, a par com o seu namoro com Amélia, trabalha e constitui uma reputação de bom rapaz. 

Até que é chamado para ir cumprir o serviço militar, poucas semanas antes da data agendada para o seu casamento com Amália. Mas, após a recruta, António é destacado para ir para a guerra colonial, e assim, segue para Angola. 

Em Portugal, a mãe e Amélia continuam a receber as cartas de António. Cada vez mais espaçadas, cada vez mais descritivas, cada vez mais frias, algumas censuradas... Amélia teme estar a perder o homem por quem se apaixonou, e a verdade é que os horrores da guerra estão, efetivamente, a transformar António. 

Em Angola, António conhece Dulce, uma angolana por quem se perde de amores, e vive uma paixão ardente. E, na terra, Amélia olha todos os dias para o enxoval e reza pelo regresso do noivo. 

Até que António vai para uma zona particularmente bélica, e desaparece sem deixar rasto. É dado como morto. Amélia e a mãe, perdidas de desgosto, realizam um funeral, de caixão vazio, apenas para terem uma despedida digna. Os anos passam, e a jovem casa com um rapaz da terra. Até que... já devem estar a ver  no que isto vai dar... António reaparece! Esteve encarcerado durante vários anos, tendo sido torturado todo esse tempo, até que consegue planear uma fuga com outros companheiros. 

Consegue contactar as tropas portuguesas que começam a deixar o território ultramarino, e regressa a Portugal. É recebido como um herói, mas será que está tudo tal como havia deixado anos antes? Obviamente que não, a começar pelo "pormenor" de ir encontrar uma Amélia casada com um dos seus amigos de infância. 

A história é interessante o suficiente para nos fazer querer ler até ao fim, mas nota-se o dedo jornalístico de Júlio Magalhães. Há partes que estão escritas como se de uma notícia se tratasse: rápidas e incisivas. Atenção, não é um defeito, mas também não deixa espaços para a imaginação preencher. O livro tem a dimensão certa para a narrativa, e não há necessidade de estar com paninhos quentes para aquilo que aconteceu no Ultramar, e as consequências que tais eventos tiveram juntos das famílias e pessoas próximas de quem lá esteve a combater. 

Júlio Magalhães escreve no início que a história foi inspirada em relatos de ex-combatentes. Portanto, António e Amélia, possivelmente, são pessoas reais que podem já ter cruzado comigo - ou com um de vós - algures por aí. E é nisso mesmo que fico a pensar: quantas pessoas anónimas terão histórias de vida dignas de livro, e que nos escapam por entre os dedos? Essas narrativas, um dia, calar-se-ão para sempre, e todos ficaremos a perder.  

Este livro foi lido para os projetos "Estações Literárias - Verão" (categoria autor nacional) e "Português é Bom" (letra U).

quinta-feira, 23 de julho de 2020

Lido: Os Herdeiros da Terra, de Ildefonso Falcones

Eu sei, eu sei... atrasada com opiniões, como de costume. Mas, em minha defesa, desta vez são apenas dois os livros, cuja opinião ainda não foi publicada: este, Os Herdeiros da Terra, e outro de um autor nacional. 

Iniciemos a "corrida" das atualizações, então. 

O livro Os Herdeiros da Terra é uma sequela de A Catedral do Mar (que li em abril de 2018: link). Lá seguimos a saga de Arnau Estanyol e a sua demanda como homem livre numa Barcelona perfeitamente medieval, bem como as suas desavenças com a família da tia: os Puig. A construção da Catedral de Santa Maria do Mar foi o cenário para este livro magnífico que, entretanto, "ganhou" a sua própria série na Netflix, em 2018. 

Entretanto, passaram alguns anos, e Arnau já é um homem de algum idade, e tomou para sua proteção o jovem Hugo, que perdeu recentemente o pai. Hugo tem apenas 12 anos e vê Arnau como um mestre e cujas opiniões segue sem pestanejar. Um dia, os Puig retornam a Barcelona, e rancores antigos vêm ao de cima. Hugo assume para si as dores de Arnau e depois de um episódio que envolve os mesmos Puig é humilhado, destratado e obrigado a deixar os estaleiros onde trabalhava sob orientação de um genovês, mestre de construção de barcos.

Sem perspetiva de futuro, Hugo divide-se entre a lealdade que tem por Bernat, amigo e único filho de Arnau, e a necessidade de sobreviver. Encontra trabalho junto de um judeu que lhe ensina os segredos do mundo dos vinhos e das vinhas. É com esta família judia que, em tempos, também havia sido a âncora de Arnau, que Hugo descobre o amor. 

Este livro é um tratado. São 880 páginas, onde Hugo divide o protagonismo com o vinho. Temos de nos lembrar que, naquela altura, e estamos a falar de um período de tempo que começa em 1387 e vai até 1423, o vinho era um bem de primeira necessidade, a par do pão e/ou cereais. 

E é aqui que o livro pode pecar: no excesso de explicações sobre vinhas e vinhos. Eu perdia-me quando o autor começava a descorrer toda a informação possível e imaginária sobre este assunto, que assumo que possa ser muito interessante, mas que não acrescentava nada essencial à trama principal. Mesmo as questões dinásticas eram interessantes q.b.: entendo o porquê de estarem ali presentes, mas li-as na diagonal. E por isso, e apenas por isso, que dei 4 estrelas a um livro que, se tivesse menos umas 150 páginas descritivas, era de 5 estrelas. 

A história é muito boa. A construção das personagens é brilhante ao ponto de nos levar a ofender este ou aquele, até me lembrar que não passava de ficção. Há muitas personagens, e riquíssimas, com um background muito forte e credível. Só houve uma que me deixou dúvidas quanto ao seu destino, e que gostava de saber o que lhe tinha acontecido efetivamente. 

Este livro foi lido para os projetos "Estações Literárias - Verão" (categoria livro com mais de 500 páginas) e "Mais Verão" (letra A - presente no apelido da autora Adichie).

quinta-feira, 9 de julho de 2020

Lido: Todos Devemos Ser Feministas, de Chimamanda Ngozi Adichie

Todos Devemos Ser Feministas é o terceiro livro desta autora nigeriana que leio. No ano passado, li O Hibisco Roxo e, no mês passado, li A Coisa à Volta do teu Pescoço. 


Este livro é um ensaio - adaptado de uma TED Talk - sobre o feminismo nos dias de hoje. Chimamanda conta-nos que ainda em criança foi chamada de "feminista". Conta-nos que, na altura, não sabia o que isso significava, mas, para não dar parte de fraca, assumiu o "palavrão", mas que, chegando a casa, foi consultar o dicionário. 

Depois desse episódio, assumiu plenamente o seu feminismo. E partindo desse episódio, fala dos desafios de ser mulher, nos dias de hoje.

" (...) precisamos de criar as nossas filhas de uma maneira diferente. Também precisamos de criar os nossos filhos de uma maneira diferente."

Chimamanda insta a que todos se tornem feministas: que procurem a igualdade entre homens e mulheres, porque ser feminista não significa odiar homens, ou almejar o poder para as mulheres, mas sim que o sexo feminino tenha direito às mesmas oportunidades que os elementos do sexo masculino. 

O livro termina com o conto "Casamenteiros", que está incluído na coletânea A Coisa à Volta do teu Pescoço. Este conto fala-nos de uma mulher que se casa com um homem nigeriano que vive nos Estados Unidos da América há vários anos, e sobre a dificuldade de adaptação aos costumes americanos, que o marido exige. O casamento, arranjado pelos tios, sofre com essas exigências e o laxismo machista do homem perante a sua esposa. Termina com a mulher a receber conselhos de alguém de quem se tornou amiga, e a tentar arranjar forma de voltar a tomar as rédeas da sua vida. Uma forma mais discreta de feminismo e de rebeldia de uma nigeriana que havia sido educada para servir o esposo. 

É uma reflexão interessantíssima que deve ser divulgada, porque não obriga à tomada de lados: ou as mulheres ou os homens. Apresenta factos e dados para que cada um faça a sua auto-avaliação e medite nas suas ações em prol da igualdade. 

Este livro foi lido para os projetos "Estações Literárias - Verão" (categoria livro com menos de 200 páginas) e "Mais Verão" (letra A - presente no apelido da autora Adichie). 

quarta-feira, 8 de julho de 2020

Lido: O Senhor dos Anéis - A Irmandade do Anel, de JRR Tolkien

Li este livro... penso que... na altura do lançamento do 1.º filme em 2001. Não me recordo se antes, se depois, mas foi, mais ou menos, por aí. 

Não vou obviamente fazer nenhum resumo do livro. A história é tão conhecida que era uma repetição desnecessária. Mas, aproveito esta oportunidade para fazer um pequeno exercício de memória e de comparação entre livro e filme.

Teria, sensivelmente, 18 anos quando li A Irmandade do Anel e o livro foi-me emprestado por um primo. Achei-o uma seca. Devo tê-lo lido tão na diagonal que, agora, não me recordava rigorosamente de nada. Foi como se o estivesse a ler pela primeira vez. 

E é esta a beleza da leitura. Já havia lido o livro. Já vi os filmes umas 10 vezes cada um, mas, no entanto, senti-me como se estivesse pela primeira vez naquele lugar, naquele tempo, naquele ambiente... e gostei de cada página como se fosse uma estreia na Terra Média, como se nunca tivesse ouvido falar de Bilbo ou Gandalf, de Frodo ou de Sam... 

Outro aspeto interessante desta leitura (quase nem a considero uma releitura) é conseguir estabelecer as diferenças com o filme. Enquanto que, no filme, mal Bilbo desaparece, Frodo herda os seus bens e imediatamente sai do Shire devido aos enormes perigos, no livro, há um hiato de quase 20 anos. Frodo é um hobbit com 50 anos quando abandona o Shire. 

Tom Bombadil ou Radagast, o Castanho são duas personagens que não entram nos filmes e que, no livro, têm um papel importante no desenvolvimento da ação. 

Também a figura de Golum tem uma presença despercebida no livro. Apesar de, efetivamente, não aparecer, segue constantemente a Irmandade desde as Minas de Moria. Aragorn, Frodo e Sam são os únicos que se apercebem da perseguição. E já todos conhecem a ligação desta criatura ao Anel Um, enquanto que, no filme, aparentemente, Frodo não sabe ao certo com quem está a lidar. 

Comprei a trilogia em janeiro de 2019, antes da Europa-América entrar em insolvência, mas só agora me predispus a iniciar a leitura. Nunca li os dois volumes seguintes de O Senhor dos Anéis. Esta leitura foi feita para o "Estações Literárias - Verão" (categoria livro que teve versão cinematográfica) e "Mais Verão" (letra I - que se encontra em Irmandade). 

Enfim, foi uma leitura de cinco estrelas, sem sombra de dúvidas. 


terça-feira, 7 de julho de 2020

Lido: Castlevania #1, de Kou Sasakura

Este livro foi lido para dois projetos literários que "pululam" nas redes: "Estações Literárias - Verão" (categoria ler uma graphic novel ou mangá) e "Desafio Niji Tv" (categoria ler um mangá que o título comece com a letra do teu nome - neste caso, C). 

O meu excelso companheiro já viu a série da Netflix "Castlevania", e quando procurava um título com a letra "C", deparei-me com o 1.º volume deste mangá e nem pensei duas vezes. 

Drácula declarou guerra à raça humana, e o pai do jovem Ted partiu para lutar. Ted vive à espera do regresso do pai e é seguido de perto por uma freira de seu nome Rosalee. 
Esta freira recebeu, em sua casa, um desconhecido que se encontrava ferido, e que tem estado a recuperar aos seus cuidados. Ted alerta-a, e pede-lhe que o mande embora. Entretanto, um dos principais generais de Drácula, Hector, está desaparecido, e este envia alguns dos seus subordinados procurá-lo. 
Ted e Rosalee estão a jantar quando são surpreendidos por um lobisomem. Ted tenta lutar com ele, mas, rapidamente, é "chutado" para fora da luta, e dá de caras com o desconhecido.Suplica-lhe que salve Rosalee, mas o homem nada diz. O menino deseja ter os seus poderes, e o homem coloca-lhe um desafio: se ele fosse malévolo, ainda assim desejaria ter aqueles poderes? O desconhecido - que é Hector - é reconhecido pelo lobisomem que se afasta. Esta manifestação de poder alerta Isaac, um dos enviados de Drácula, que assim consegue seguir a pista de Hector. 

É uma primeira parte razoavelzinha. Não é boa como outras que me levaram a ler, de seguida, todos os volumes, mas é interessante o suficiente para nos manter na qualidade de leitores. Falta ler o 2.º volume, para saber a conclusão desta história. 

segunda-feira, 6 de julho de 2020

Lido: Mitologia Nórdica, de Neil Gaiman

Neil Gaiman confessa, no início do livro, que desde cedo se deixou fascinar pelos mitos nórdicos. Teria sete anos quando conheceu Thor, através da banda desenhada. Ao longo dos anos, aprofundou os seus conhecimentos sobre as lendas e mitos vindos do Norte da Europa. 

Thor e Asgard, Odin e Loki tornaram-se figuras conhecidas, mas, muitas histórias e lendas perderam-se com o passar dos anos e séculos. 

Este livro reúne 14 histórias protagonizadas por deuses nórdicos, que Gaiman se esforçou por recontar, "com o máximo rigor que me foi possível e da forma mais interessante que consegui". 

Gostei muito. Os meus conhecimentos sobre a mitologia nórdica resumem-se ao filmes da Marvel, mas, ainda assim, consegui reconhecer muitos nomes associados a estas personagens. É um livro para se ir lendo. Não há, obviamente, uma linha narrativa a seguir, logo, estes contos podem ser lidos por qualquer ordem. Pessoalmente, e como me embrenhei nestes pedacinhos mitológicos, li-o rapidamente. 

Este livro foi lido para os projetos "Estações Literárias - Verão" (categoria título com letras que formem a palavra MAR) e "Mais Verão" (letra M).



domingo, 5 de julho de 2020

Lido: O Livro dos Negros, de Lawrence Hill

Quem é que tem um blogue e depois não o atualiza há medida que vai lendo, quem é?? Se responderam "és tu, Cristina Maria", parabéns, venceram o jogo. 

Depois do último volume da trilogia inicial de Hunger Games, já li... (preparem-se!)... mais cinco livros. Isso está manifesto neste blogue? Não. Mas vai estar.

Vi, há não sei quantos anos, uma série chamada "The Book of Negroes". Excelente. Cinco estrelas. E agora, li o livro que deu origem à série e que eu desconhecia que existia. 

Vivemos tempos turbulentos. A morte de George Floyd nos Estados Unidos deu origem a uma vaga de discussões em torno do racismo, e ainda hoje li que mais uma estátua de Cristovão Colombo havia sido vandalizada algures nos EUA (contexto: Cristovão Colombo que está ligado à descoberta da América, e consequentemente ao tráfico de escravos). E este livro, está tanto ligado a essa problemática como a força e coragem de uma única mulher que não se deixava dominar: Aminata Diallo. 

Resumidamente: conhecemos Aminata quando ela já é uma velha senhora. Estamos em 1802, em Londres. Aminata está a trabalhar de perto com um grupo de abolicionistas britânicos, para eliminar o comércio de escravos. Esta mulher começa então a contar-nos a sua história. 

Aminata tem 11 anos e vive despreocupadamente numa aldeia, na região que hoje será, creio, o Niger. Os pais são de tribos diferentes, mas isso não foi impedimento para a sua união. São apaixonados, livres e ensinam a filha a nunca baixar os braços. Num dia em que vai ajudar a mãe, num parto, numa aldeia próxima da sua, é raptada e aprisionada - os pais são mortos à sua frente!

O que se segue é sua jornada para os Estados Unidos, onde chega quase morta. Acaba por ser comprada por Robinson Appleby, dono de uma plantação de índigo, na Carolina do Sul. É ali que aprende a falar inglês e a ler às escondidas. É também ali que casa com Chekura, um rapaz que havia feito a travessia do Atlântico com ela. Acaba por engravidar, mas a criança é-lhe retirada por Appleby. 

Por nunca se submeter, Aminata é frequentemente castigada por Appleby, até que acaba por ser vendida a Solomon Lindo, um judeu que inspeciona as plantações de índigo e que reconhece o intelecto de Aminata. A vida na casa de Lindo é muito mais tranquila, mas Aminata acaba por ter acesso a informações determinantes que vão servir de rastilho para a maior decisão da sua vida: fugir e tentar regressar à sua terra. Aproveitando uma viagem, com o patrão, à Nova Escócia, Aminata consegue ser, de novo, livre. 

Mas é óbvio que as coisas não ficam por aqui e há outros acontecimentos que irão ter um papel preponderante na vida desta mulher.

O Livro dos Negros: porquê este nome? A explicação é simples. Deve-se ao documento histórico, mantido por oficiais navais britânicos, no fim da Revolução Americana. O documento oficializou os negros que serviram o rei durante a Guerra. Apenas os negros que estivessem listados no "Livro dos Negros" poderiam escapar à escravatura e conseguir sua liberdade.

É um livro extraordinário, tal como a série. A escravatura e o tráfico são temas centrais nesta saga, mas, as capacidades e a coragem de Aminata são, de longe, o assunto principal. Este livro é, no entanto, ficção. Gostava muito de acreditar que, nos finais do século XVIII e inícios do século XIX, houve uma Aminata - ou várias - que lutaram pelos seus direitos, especialmente, por aquele que determina que nenhum homem é dono de outro. Li esta obra no Kindle, e está disponível na Amazon.