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sexta-feira, 12 de fevereiro de 2021

Lido: Meridiano 28, de Joel Neto

Esta leitura já me andava atravessada há algum tempo. Sigo o autor nas redes sociais, e sempre tive curiosidade de explorar a sua escrita, para além das crónicas dos jornais. Sendo que uma das categorias das Estações Literárias é "livro recomendado por booktuber ou bookblogger", optei por (finalmente!) "atirar-me" a Joel Neto. 

Simultaneamente, usei o apelido do autor para a minha participação no projeto "Inverno QB" - letra N.

E que leitura espetacular, senhores e senhoras! Espetacular. 

Estava, confesso, meio intermitente nas páginas iniciais. Não sei explicar bem o porquê. Li as primeiras páginas duas vezes, porque parecia que aquilo que havia lido estava em estrangeiro e não estava a conseguir compreender o sentido da coisa. Acho que se deve ao cansaço. Já são muitos meses desde o início da pandemia, e a minha acuidade mental já viu melhores dias. 

Depois, à medida que ia lendo, o cérebro lá engrenou e consegui desfrutar. José Filemon Marques é um solteirão, na casa dos 40, dono de uma loja de informática em Lisboa. O tio, Hansi Abke, luso-alemão, faleceu há pouco, e era a única família que lhe restava, apesar de nos últimos anos não se falarem. 

Pouco tempo depois da morte do tio, é contactado por um homem que lhe diz que a proposta ainda está de pé, se ele quiser cumprir o acordado. Estranho, não? Vinte anos antes, o mesmo José Filemon foi a Nova Iorque, a convite de um misterioso milionário, Devon Fitzhugh, que lhe propõe escrever a história do seu tio. A razão é simples: Hansi havia sido caçador de nazis. Esta história como que empolgou um jovem José que, de volta a Lisboa, fala com o tio sobre o assunto. O homem recusa voltar ao passado e é nesse momento que a relação dos dois - que nunca foi especialmente calorosa - se torna especialmente agreste e distante. O adiantamento do livro é todo gasto, e ele nunca mais pensa no assunto, até porque o tio leva todo o material que Fitzhugh lhe havia entregado. 

Duas décadas passam, o tio morre e José Filemon Marques é, então, visitado pelo representante do milionário norte-americano que lhe "cobra" o cumprimento do acordo, até porque recebeu um adiantamento. 

José Filemon Marques embarca então numa viagem pelo tempo (e pela Europa) a tentar reconstruir os passos de Hansi Abke, desde os tempos felizes da sua juventude, nos Açores, onde ingleses e alemães viviam em sã comunidade nos anos 30, antes da 2.ª Guerra Mundial. Guiado pelos diários escritos por um jovem Hansi, somos apresentados a uma ilha do Faial cosmopolita, onde navios e aviões faziam escala entre os EUA e o resto da Europa. 

Assim, a narrativa salta entre 1939 e 2017 - tempo presente da ação, quando Filemon enceta as suas investigações que irão levar por caminhos surpreendentes. 

Por não conhecer a escrita de Joel Neto, não sabia o que esperar. E fiquei agradavelmente surpreendida pela riqueza da escrita, e pela manta de histórias que se ia fiando ao longo das páginas. À sua maneira, eram poucas as personagens - mesmo aquelas, claramente, secundárias - que não tinham um papel especial ou com importância. Quadro a quadro, Joel Neto apresenta-nos um trabalho excepcional e arrebatador. 

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